quinta-feira, 16 de abril de 2009

Emoções

O vinho é um alimento. Mas não é um alimento qualquer. Para além de alimentar o corpo, alimenta também a alma! Mesmo antes de o ser, o vinho provoca os nossos sentidos. A forma como a vinha se relaciona com o território, primeiro suavemente, de maneira quase pueril e, depois, enérgica e vigorosamente, aguentando as situações mais difíceis. O crescimento da vinha e a sua relação com a água. A sua evolução ao longo do ano. As cores das folhas, das hastes e dos troncos das videiras, dos cachos de uvas, desde o abrolhamento à maturação. Os aromas, especialmente associados a algumas castas. Os sons, como o do vento a atravessar a rede mais ou menos densa das ramadas. As folhas, com os seus diversos tons de verde ou coloridas de impressionantes vermelhos, amarelos e castanhos, a bordejar as latadas ou a atapetar o chão. As elegantíssimas gavinhas, a desenhar na natureza ou a abraçar firmemente os arames… O tempo das vindimas é uma festa para os sentidos. Todos. A roga do pessoal necessário para esse trabalho, apelando à parentela e às relações sociais. O trabalho no campo, da apanha dos cachos ao carregar dos cestos. O transporte das uvas, desde as vinhas até aos lagares – verdadeiros cenários de um ritual de passagem, onde a uva se transforma em vinho. A animação da pisa: as cores, a música, as canções, os piropos e insinuações, os aromas intensos, as comidas e as bebidas, os abraços, as danças… A maturação do mosto nos lagares com a continuação do extraordinário trabalho da natureza: quem não se impressiona com o enérgico sussurro do mosto a ferver? Todo o trabalho de envasilhar o mosto, de acordo com os processos mais adequados a cada tipo de vinho… Engarrafar o vinho constitui mais um momento de encontro, de partilha e de festa. Sendo adequado acontecer em épocas mais frias, tal como a matança do porco, aconselha a um casamento feliz entre o reco e o vinho novo…
A cerimónia da abertura da garrafa – não falando já nas tão especiais aberturas a quente do Vinho do Porto ou dos espumantes e champanhes com o sabre. A rolha, com todas as particularidades e o aroma da sua parte inferior, que mantém a maior intimidade com o vinho…
A prova. Primeiro, a cor, incluindo a limpidez e a transparência. Depois, o nariz, com toda a envolvência de aromas devidamente encaminhados por um copo adequado. Finalmente, a boca que nos dá a prova final. A memória faz-nos relacionar os sinais que nos chegam pelos diversos sentidos com todas as reminiscências que temos do passado, não só em provas de outros vinhos, mas de toda a nossa vida…
As imaginativas e inesgotáveis “rodas” das cores, dos aromas ou dos sabores em nada substituem as nossas impressões, dadas pela nossa própria análise, pelos nossos próprios sentidos, provocando as nossas emoções. A escolha do vinho adequado a um determinado prato, ou de um prato que pede um certo vinho. O acompanhamento e a companhia – se há bebida que não apetece tomar sozinho é exactamente o vinho que é, por natureza, uma bebida de companhia.
Um vinho novo pode trazer-nos muitas emoções. Mas nada substitui a emoção da descoberta de uma garrafa guardada com apego e carinho que, no momento da abertura, se é certo que nos pode desiludir, também nos pode levar a um grande e inesquecível momento, despertando todos os sentidos e conduzindo a grandes encontros, desde que bebido com moderação.
Cabe ao Homem, a todos e a cada um de nós, zelar para que sejam preservadas as condições que permitem a sua boa produção e consumo, em especial os territórios de produção. De resto, a sua comprovada apetência para o turismo, aumenta a sua importância económica, cultural e social, sendo pois uma atitude inteligente velar para que essas áreas sejam dotadas das políticas adequadas com vista a que esse grande objectivo seja cumprido!

Manuel de Novaes Cabral

blue Wine 26

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