quinta-feira, 16 de abril de 2009

Dois Desafios


Numa era de globalização, as especificidades dos territórios são uma mais-valia que apoia a sua identidade, o seu desenvolvimento e a sua competitividade. Quando esta especificidade é um produto como a vinha e o vinho, torna-se um recurso económico multifacetado que pode ser trabalhado por diferentes sectores. A relação virtuosa entre o sector vitivinícola e o sector do turismo foi já afirmada por diversos especialistas da Gestão e da Economia. Foram promovidos, apresentados e divulgados estudos que o confirmam. Os territórios permitem explorar um segmento que comporta um grande potencial de crescimento, quando comparado com outros do mesmo sector. Em Portugal, as relações entre estes dois sectores cresceram muito nos últimos anos, sendo a realidade de hoje claramente diferente da de ontem. O diálogo e as pontes entre ambos são cada vez mais frequentes mas, por vezes, divergem, não se conseguindo um resultado que afecte da forma mais positiva o território e os agentes que nele operam. As rotas do vinho são, talvez, o resultado mais evidente desta relação. Durante anos, viveu-se com entusiasmo a estruturação de rotas, estabelecendo percursos, recuperando património, diversificando serviços prestados e transformando a forma de bem receber num recurso alternativo e de fortalecimento da marca do vinho produzido e comercializado, abrindo mercados e criando consumidores. Foi um tempo de entusiasmo, em certos casos de retorno às origens, a que muito deve o estado actual de coisas. Há, em todo este processo, uma questão que não foi devidamente esclarecida: as rotas são parte integrante do sector agrícola ou do turismo? Não se pense que esta é uma questão menor; da sua resposta dependem, designadamente, a definição de políticas e de financiamentos. Em minha opinião, as rotas são transversais e permitem responder a um conjunto de questões. As rotas são cultura, porque estamos a preservar parte significativa do património construído, natural e paisagístico; são ambiente, porque estamos a contribuir para a sua preservação e para o ordenamento do território; são economia, pois estamos a melhorar a prestação de um sector essencial e, ainda, a manter a população em áreas do território a caminho da desertificação; e, por tudo o que precede, são também defesa nacional. Um dos problemas de estarmos perante um tema tão abrangente é, exactamente, a falta de uma voz na sua defesa, pois a agricultura é só parte de um todo. Como o turismo. Mas serão actualmente, as rotas do vinho o principal instrumento do enoturismo? O alicerce em torno do qual este segmento se deve estruturar e orientar? No actual contexto mundial e face a um novo perfil de turistas e a um ambiente concorrencial entre destinos e segmentos turísticos, sou tentado a dizer que não. São um elemento indispensável, nomeadamente no que respeita à estruturação da oferta, mas já não o são em termos de procura. Necessitamos, isso sim, de dar atenção e adaptar estruturas à procura moderna, promovendo o território através de elementos de notoriedade e de entretenimento compósitos e não monotemáticos e garantindo o envolvimento empenhado de todos os agentes. Estamos, pois, perante dois desafios. O primeiro obriga-nos a repensar o enoturismo, posicionando-o e tornando-o um motor de desenvolvimento económico, cultural, social e ambiental. O segundo, obriga-nos a reforçar a competitividade através da adopção de “standards” de qualidade, da promoção do trabalho em rede entre os diferentes órgãos de governo, entre os agentes dos dois principais “clusters” ligados ao vinho e entre o conjunto de serviços que interferem na descoberta do território e da temática. O enoturismo não é apenas uma forma de turismo associada ao sector vitivinícola, mas uma forma de melhor promover o território, isto é as cidades e as regiões, associando-as a uma denominação de origem que o próprio sector promove e que todos devemos preservar.

Manuel de Novaes Cabral
blue Wine 14

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