quinta-feira, 16 de abril de 2009

Qualidade. De quê?



Colocada a questão naqueles termos, todos somos favoráveis à ideia. O que falta saber é do que é que estamos efectivamente a falar e como pode essa qualidade transformar-se num pilar da oferta que funcione como factor diferenciador e de promoção! Desde logo, qualidade do território. Boas acessibilidades, cidades, vilas e aldeias bem cuidadas, paisagem bem preservada e qualificada, bem como bons serviços: hotéis, restaurante, cafés, turismo de habitação e rural, tal como o comércio e os serviços de saúde. Contrariamente ao que alguns possam pensar, atingir esse patamar não é nada fácil. Não basta o “típico” ou o tradicional… É necessário ter uma oferta de serviços estruturada, diversificada e de grande qualidade, que não só satisfaça o cliente, mas que o motive a voltar e, sobretudo, a recomendar a visita aos seus amigos e conhecidos.

Já no que respeita ao enoturismo, quando falamos em qualidade podemos estar a falar em variadíssimos aspectos: no vinho em si; no seu processo de produção, da vinha ao copo; no seu processo de apresentação, promoção e venda; nas unidades de turismo de habitação ou de turismo rural; nos serviços e produtos associados ao território vitivinícola; nas actividades paralelas que são oferecidas ao turista na região considerada… Poderíamos continuar numa enumeração exaustiva que depressa cansaria o leitor – caso não o esteja já.

Quando uma região vitícola faz a sua promoção, quer vender o quê: o vinho ou a própria região, enquanto destino turístico? Ou as duas coisas? Esta questão – simples, pelo menos na sua formulação – é de resposta complexa. E a complexidade da resposta advém dos diversos interesses envolvidos, nem sempre confluentes, muitas vezes antagónicos. As grandes marcas que estão nos mercados nacional e internacional desenvolvem as suas campanhas com autonomia e particularmente vocacionadas para o produto vinho. No entanto, como têm interesse em vincar a identidade do produto, envolvem frequentemente essas campanhas na “mãe-terra” que o produz. Ora, ao chamarem a atenção para o território de origem, é da maior importância que este corresponda ao nível de qualidade que querem associar ao produto.

É exactamente aqui que o problema maior se coloca: vinhos de grande qualidade produzidos em regiões que não apresentam ao visitante um nível equivalente de qualidade, quer na paisagem, quer na hotelaria, na restauração ou nos serviços. Cada vez mais, quem compra um vinho quer conhecer a sua região de produção, a matéria-prima, o “terroir”. Todos conhecemos exemplos de empresas muito bem colocadas no mercado internacional que transformam as suas propriedades em verdadeiras “ilhas de qualidade”, às quais levam os seus clientes, evitando qualquer contacto com o meio envolvente. Estas “ilhas” são importantes, pois funcionam como um farol e factor de motivação; mas não basta: o seu resultado deve beneficiar a região envolvente e contribuir para a atractividade do território na sua globalidade.

Quer tudo isto dizer que as empresas não podem alhear-se do desenvolvimento e da sustentabilidade das regiões de produção onde se inserem. Por seu lado, estas podem beneficiar muitíssimo da projecção nacional e internacional que essas empresas proporcionam. É, de facto, um casamento de interesse mútuo. A visibilidade que o enoturismo confere nos dias de hoje é muito grande, sendo um relevante factor de incremento da economia local.

Para além dos aspectos já referidos, há muitas actividades que podem ser criadoras de emprego e animar as regiões vitivinícolas. Pense-se apenas nas inúmeras actividades tradicionais ligadas ao artesanato ou à gastronomia – muitas delas a recuperar, por terem entretanto desaparecido. Os dados mostram também que em muitas regiões vitícolas, pequenos e médios produtores vendem grande parte da sua produção na sua propriedade (“cellar-door”), em provas ou a turistas – evitando assim enormes custos de promoção e de comercialização do produto. Para que isso aconteça, é necessário que todos – particulares, empresas, instituições públicas e privadas – remem no mesmo sentido e promovam activamente a qualidade a todos os níveis. O que está em causa é, não apenas vender o produto mas, a partir dele, promover a região, mantendo os níveis de qualidade e de sustentabilidade necessários. Em suma: fazer com que as pessoas se sintam bem no seu território, de preferência a fazer coisas de que gostem!

Manuel de Novaes Cabral
blue Wine 20

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